O poder público como ceifador de vidas

Lembro quando em 2010 houve um acidente na mina San José no Chile onde 33 mineiros ficaram soterrados a 700 metros de profundidade, recebendo mantimentos por um pequeno túnel. Como todos sabem, houve uma comoção mundial à época. Todos queriam ver os mineiros saindo vivos daquela situação desesperadora.
Em meio a todas as notícias e acompanhamentos, me perguntei o quanto o governo gastaria para salvar aqueles mineiros. Checando os dados atualmente, verifiquei que o valor foi de 22 milhões de dólares¹, 666,67 mil dólares por mineiro.
Notem que ao olhar por um prisma mais amplo, perceberão que o governo, através de seus representantes, toma decisões que impactam na vida ou morte de milhares de cidadãos. Eles poderiam simplesmente ter deixado os mineiros lá, foi tudo muito caro...
‘Mas isso seria um ultraje!’, você pode argumentar. Bem, na verdade, esse tipo de decisão ocorre diariamente. Trilhões de reais são arrecadados em tributos pelo Brasil e cabe ao Governo decidir em que utilizá-los com uma razoável discricionariedade. O que fazer? Investir em segurança (59.627 homicídios no Brasil em 2014)² ou investir em saúde para reduzir a mortalidade infantil (em 2014, morreram aproximadamente 56.388)³.
Portanto, para um governo, enxergar a vida e o bem-estar dos cidadãos é, a priori, uma análise financeira, política. Uma análise infinitamente complexa, porém, ainda, uma análise.
Achei interessante uma matéria veiculada no portal de notícias UOL que demonstra a chamada judicialização da saúde. A matéria aponta para uma tendência de se aumentarem os gastos do SUS com o fornecimento de remédios caríssimos que atendem a poucos cidadãos com doenças raras – os governos do Rio Grande do Norte e Minas Gerais entraram na justiça alegando isso e hoje a matéria está em debate no STF.
Em 2016, a despesa com medicamentos fornecidos em atendimentos a demandas judiciais custou 1,2 bilhões de reais, quase 7% dos recursos destinados à compra medicamentos da pasta e, como afirma o Ministro da Saúde, Ricardo Barros, isto ‘prejudica o fornecimento de outros serviços no sistema’.
A matéria não cita, mas vamos supor que esses remédios supercaros fornecidos através de decisões judiciais tenham atendido cerca de 50.000 cidadãos. E enquanto aos outros que morrem todos os dias por não terem acesso a medicamentos e cuidados básicos? Notícias são veiculadas semanalmente mostrando o caos que o sistema público de saúde se encontra e, claro, apesar de o problema ser multifacetado, recursos extras seriam bem-vindos.
Seria o caso dos parlamentares pensarem melhor essa situação e mudar a legislação? Mas você pode argumentar que fazendo isso eles condenariam à morte milhares. Mas eles - gestores e legisladores - já não condenam os que morrem em macas nos corredores dos hospitais diariamente?
Bem, é uma decisão muito difícil escolher quem vai à guilhotina, mas alguém tem que fazê-la. Só fico feliz que temos representantes preparados e honrados para escolher a melhor opção para o bem da população.

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